23 de outubro de 2012

Correspondência


Que definir desistência ou simplesmente desistir. Queria sinceramente sentir aquela emoção fumegante que nos tira da mesmice, encher-me de sonhos e ter meios para ir atrás, pois não basta somente à vontade, tem que haver os meios, aquilo que nos conduzirá. Pode ser que muitas vezes a nossa própria força de vontade nos farar nos superar, mas às vezes, os meios aos quais nos cabem não são suficientes. Vez em quando, necessitamos de novos barcos, outros ombros, alheias forças. Precisamos mais que nossa boa vontade, mais que o que temos. Talvez, necessitamos de um olhar amigo, de uma mão familiar e acima de tudo, boa vontade de quem nos circunda também. Aprendi que a vida sozinha não tem sentido, mas é a partir disso que vem o meu questionamento: sozinho ou não, o quanto se é necessário outra ajuda? Num abraço que não podemos nos dar? Um sorriso que não somos capazes de sorrir para nós mesmos? Da ajuda da matéria que é tão importante quanto a afetos e sentimentos. Fernando Pessoa fala-nos "jamais desistir", o que hora ou outra o mundo também nos diz:

Jamais desista de ser feliz, pois a vida é um espetáculo imperdível, ainda que se apresentem dezenas de fatores a demonstrarem o contrário.

Sou e estou à margem, mas sei também que não posso atravessar sozinho. Não, essa não é a margem (terceira) que propõe Guimarães Rosa em seu conto intitulado “A terceira margem do rio”, um lugar desconhecido, porém sagrado pelo rito de se ir atrás de um novo mundo, talvez. Sou mais um no meio desses tantos que estão sentados às esquinas, mas diferente deles, tenho sonhos e não estão nos carros que não posso ter, ou nas baladas que não posso frequentar. Carrego em mim, um ideal de ser humano que sonha com coisas que nos fazem superar os limites da existência. E quais são esses limites? São os nossos próprios. Sou esse que está frente ao mar, mas não encontro aquele tal Moisés que possa me ajudar na travessia. Eu poderia ir sozinho, mas sou limitado, minhas condições não me tornaram um ser que desbrava os mundos, mas não falta vontade e nem sonhos, mas também não me faltam às lágrimas choradas escondidas e em meio a essas palavras. Um desconcerto, um desencanto.

Falam-me de fé e esperança, e eu bem sei que tudo isso combina perfeitamente com ação, partir. Para onde? Sim, estou debruçado sobre a janela e pensando no que tenho, nas minhas realidades. Dói-me a incerteza das vezes que bate na trave os meus desejos.

Poesia, depois de lançada ao vento não é mais do autor e sim de quem interpreta, ouvi isso num dos textos que escrevi esses dias atrás na minha vida. Do mesmo jeito que vi mudarem e atualizarem para si o que escrevi, faço o mesmo com uma frase de Bertolt Brecht, onde ele diz que "do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento. Mas ninguém chama violentas às margens que o comprimem.". É isso. Não estou com medo dos rios que atravessarei, mas fico assustado com o tempo que eu possa sobreviver a custas das margens.

Não sou grande fã de Paulo Coelho, mas com sabedoria ele diz: "Eu esquecerei as estradas, as montanhas, e os campos de meus sonhos - sonhos que eram meus, e que eu não conhecia." Talvez seja isso, talvez eu projete uma coisa que não é para mim e meus caminhos são outros. Já que minha realidade nem sempre convém com meus grandes sonhos, ando pensando que é nisto que eu tenho que dar força, ao verbo esquecer. Talvez possa ser também que eu esteja naquele momento ruim da vida, onde ficamos a margem e a espera de um sorriso que fale que tudo vai dar certo. Confesso que não vivo a opiniões das pessoas, mas reconheço, porém, a importância que uma palavra e um gesto amigo pode nos fazer. Acredito na "palavra da salvação" proferida em quem acredita um pingo que se quer na gente!

Sabe de uma coisa? Estou agora decepcionado com alguns retalhos costurados a minha vida. São pequenas peças que se encaixam em minha vida que não sei bem lidar, mas não desisto, estou tentando, buscando, persistindo, mas como já disse: sozinho eu não consigo. Revelo-me carente, mas não aquela carência que nos empobrece e dá vazão a sentimentalismos e afazeres baratos, mas uma carência de um cuidado que não consigo possuir.

Clarice define o meu embrulho de palavras: "Escrevo como se estivesse dormindo e sonhando: as frases desconexas como no sonho. É difícil, estando acordado, sonhar livremente nos meus remotos mistérios.".

Sei que são nos acontecimentos que tiramos a melhor lição da vida, mas também sei que nem sempre aprendo com tanta dor e desencanto. Minha humanidade não precisa de afagos e reconhecimentos, mas ao mesmo tempo, encontro-me perdido no paradoxo e quero um pouco mais de olhar para as minhas coisas. Não quero um milhão de vozes me dizendo que vai dar certo, preciso de poucas vozes que digam que vai comigo trilhar um momento de minha história. É o atar das colchas aos lençóis. Já chorei; já pedi; já conversei sem respostas concretas. Não quero ouvir que o que tiver que ser será; é responsabilizar demais a sorte e nós bem sabemos que não se trata de sorte, é labuta, é ir, mas não posso ir se não tenho meios, se não tenho ajudas. Sinceramente é triste o chegar frente ao gol e chutar na trave, não pelo fato de a bola não ter entrado, mas de ter tido uma única esperança e as coisas não fluírem do jeito que imaginei que seria. É ruim saber que a todo tempo estou virando a ampulheta do tempo, renegando o seu fim, tentando o que pode dar certo.

Vou direto ao ponto: preciso de um olhar que me olhe na mesma direção que esteja meus olhos, nem acima e nem abaixo de mim, que olhe o reto e o caminho que tracei e que se coloque na figura que estou caracterizado hoje.  Quero uma solução para os sonhos que parece não darem certos, quero notas soltas e partituras postas. Desejo poder finalmente revisitar a página em branco que a vida oferece, sem ter que voltar às páginas anteriores e mudar alguma coisa, apagar um detalhe. Quero que as frases de efeito emocional se cessem e possam alguma vez fazer alguma coisa útil a meu respeito. Penso que não é ruim eu direcionar as minhas atenções, algumas regras. Penso que tenho o direito de pedir, de solicitar, de sonhar e querer que estejam comigo. Sei que muitos outros andam por aí pensando da mesma maneira, mas não externam os seus melindres e medos, suas angústias, seus apelos de atenção e por esse jeito de guardar o que se passa por dentro, se afundam nas coisas mais fáceis, se entregam as margens e ali vivem como se não tivessem predisposições a atravessar. Quero meu direito humano investido por uma dor que hoje me soa grande, mas que amanhã será pequeno diante a vida daqueles que amo e terei e farei com grande paixão o ato de ajudar a serem melhores e a conquistarem seus sonhos, seus rumos e barcos para as travessias.

Quero poder sair das esquinas e calçadas. Quero alcançar meus sonhos e objetivos. Reconheço-me carente de mim mesmo, mas sou indigente e preciso que me toquem a face, as mãos amigas, para quem sabe assim, me talharem novas metáforas e bons sonhos. Preciso de nada mais e nada menos, que alguém simplesmente me dirija a “palavra da salvação”, não a divina, mas a humana, que reconstruí êxodos e êxitos!

Um comentário:

Anonymous disse...

Outro texto bem escrito que me fez pensar no mundo e como funciona tudo...