17 de dezembro de 2012

As futilidades dos outros - e as nossas com certeza


Sou da geração que tudo se crítica, tudo se fala, muito se comenta. Minha geração é essa que fala dos outros com a maior cara de pau sem olhar no espelho e perceber que escondemos feridas muitas vezes maiores do que aquelas que apontamos. Sou dessa geração, que julga a futilidade dos outros como se não tivéssemos também alguma coisa de fútil, de sem graça. Bem vindo a geração fala mais que a boca e faz menos o que devia fazer.

Nos termos mais práticos, a minha geração faz parte da corja que julga como se fosse o rei da cocada preta (ou branca, tanto faz); aponta os defeitos alheios como se fossem os seres mais perfeitos do mundo; fala mal e na pretensão de ser um pouco mais sofisticado, diz apenas que comenta sobre algo ou alguém, porém esquece-se da subjetividade, lembra-se de elevar-se ao grau máximo de pessoa mais desprovida de futilidade, mas não demora muito a se entregar a tudo aquilo que julgamos, apontamos os dedos e a nossa arma mais perigosa: a língua.

Fala-se do funk que o sujeito escuta aos berros dentro dos transportes públicos - que fique claro que não sou a favor de música alta dentro de ônibus e coisas afins - mas inferniza os vizinhos do mesmo modo com aquela música de boate que não agrada a vizinha que é adepta dos sons gospel que por sua vez escuta seus louvores no último e de certa forma ataca violentamente a vontade de silêncio do vizinho ateu que vai as ruas fazer protestos e inutilmente ou não, incomoda e viola os segregados valores pessoais e individuais. No fundo, alguma coisa sempre vai incomodar as outras e por isso julgaremos fútil.

Julgamos fúteis aqueles que por algum motivo (e de todo direito seu) prefere a vadiagem à vida dentro de casa. Falamos sobre a futilidade que está em gastar madrugadas dentro de casas noturnas ao invés de se estar em casa dormindo, ou lendo um bom livro, escutando uma boa música: mas quem definiu mesmo o que é bom? Onde esta o relativo das coisas e o cada um cuidando da sua própria vida?

Atacamos a forma de viver dos outros que passam horas conversando e se drogando nas esquinas, julgando-os incapazes e fúteis pela forma de vida que se vive, mas dentro de casa somos obrigamos a cumprir todos os dias as mesmas coisas. Acordar cedo, passar o café, limpar a casa, fazer o almoço, lavar a louça, fazer o café da tarde, jantar, louça e cama. Não estaria aí também a futilidade do homem contemporâneo que se diz normal e que não vive a futilidade? Lembremo-nos que apenas abrimos a janela e vemos passar um monte de coisa a nossa frente, mas não é porque podemos olhar que temos o direito de julgar. Aquele que passa pela calçada pode também estar julgando aquele que fica na janela observando e comentando a vida dos outros (as famosas fofoquinhas) como seres mais fúteis, pois se acostumaram com aquele tipo de atividade e isso é normal? Quem e o que nos dá o direito de dizer que um ser humano com três, quatro faculdades no currículo é menos fútil que o cara que não saiu do Ensino Fundamental? E quem disse que a dona de casa é menos fútil que a garota que trabalha em um prostíbulo? Futilidade é coisa íntima, interior de cada um. Assim como o brega nos é inerente, a futilidade faz parte do nosso cotidiano e desse modo, a futilidade do ser começa em nós, quando julgamos alguém ou alguma coisa por um mero ataque de aparência ou para simplesmente nos sairmos superiores.

Você que prefere Machado de Assis não é mais ou menos fútil do que alguém que lê Stephenie Meyer; você que escuta Chico Buarque não é melhor que alguém que se acaba ao som de Valesca Popozuda; você que por um acaso vai semanalmente a uma linda exposição de orquídeas (e que programa mais chato seria esse não?) não é menos fútil do que aqueles que preferem frequentar as pistas de skates. Somos da geração que ataca de graça, fala como se fossemos os mais finos, mas nos enganamos com tudo isso, quando era para sermos da geração do tudo junto e misturado, pois é isso que somos: um vasto campo de cultura e coisas a se fazer, porém preferimos perder o tempo a julgar a conhecer; de falar ao invés de escutar; de sentenciar os outros pela futilidade em vez de futilizar-se em primeira pessoa do singular, afinal de contas, já diz a expressão de que todo mundo te um dedinho podre.

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